quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Eu estou do lado dos mauzões


Como tenho vindo a constatar que, no caso da greve dos estivadores, os pesos nos pratos da balança entre apoiantes e detractores estão muito desequilibrados, venho aqui deixar os meus 64 kg no prato dos apoiantes. A ver se a coisa fica um nadinha mais equilibrada.
Ao longo das últimas semanas, todos vimos nascer uma nova categoria de monstro. Para quem já estava farto de tentar impor o respeito aos seus filhos e concluído que nem o Homem do Saco nem o Bicho Papão resultavam, surge agora uma nova esperança com o novo, o horrífico, o mauzão… o Estivador.
Honra seja feita ao Governo que conseguiu criar esta nova personagem junto da opinião pública. Bastou lançar uns rumores acerca dos vencimentos e das regalias dos estivadores e, em menos de nada, conseguiu o feito de pôr pessoas, a quem fez tremendos cortes nos rendimentos, a revoltarem-se contra a única classe de trabalhadores que, até hoje, fez alguma frente de verdade ao próprio Governo. Tem havido outras greves e manifestações mas nada que faça o Governo recuar, com excepção da TSU. Quer dizer, quando há manifestações à porta da Assembleia em dia de votação de uma determinada lei, o Governo recua ou avança, mas apenas na hora da votação para não coincidir com a chegada dos manifestantes. Mas isso devem ser coincidências.
Todos querem alguém que faça frente ao Governo, mas quando aparece quem o faz, primeiro é preciso ver a sua folha salarial. É sabido que, neste país, só se pode queixar quem ganhar menos que o salário mínimo. Até parece que os estivadores não sofreram já com os mesmos cortes e aumento de impostos. E ao fazerem greve, mesmo que apenas às horas extraordinárias, fazem-no às suas custas, em protesto contra a precariedade em que a sua profissão corre o risco de ficar.
É isso e o facto de se ter descoberto que para entrar na estiva é mais fácil sendo familiar ou amigo de alguém que já lá esteja. Ui ui. Uma tremenda imoralidade. Aliás, este é um dos factores que mais revolta tem levantado nas pessoas e nos políticos. E com toda a razão. Sim, porque uma coisa é a Ministra do Ambiente contratar a irmã da Ministra da Justiça, obviamente pelo extraordinário currículo, outra coisa é os estivadores fazerem isso (até porque duvido muito que a irmã da Ministra perceba alguma coisa de como carregar um navio).
Claro que nem toda a gente tem a sorte de trabalhar em sectores supostamente tão pequenos, unidos e poderosos como a estiva ou os partidos políticos, mas a ideia que dá é que as pessoas que criticam a greve dos estivadores são aquelas que, há muito, abdicaram do seu direito de reivindicar contra as dificuldades que lhes são impostas e procuram consolo na miséria alheia. É mais fácil suportar as dificuldades sabendo que não se está sozinho.
Apesar de todo o poder que lhes é atribuído, foram precisos três meses de greve dos estivadores para que o Governo aceitasse apresentar uma proposta alternativa à primeira lei. Três meses. Cá para mim, fizeram essa proposta nos dois dias antes de a apresentarem porque o resto do tempo devem ter estado escondidos atrás dos contentores a ver se os malandros desistiam da greve. Mas não desistiram. E com isso conseguiram que o Governo fizesse algumas cedências a uma lei imposta pela tia Merkel, com o objectivo de perceber se por cá a coisa corre bem para depois se implementar igual no resto da Europa. É como os medicamentos novos. Primeiro testam-se no terceiro mundo e só depois se usam no primeiro. Tal e qual.
De qualquer das formas, alguns sindicatos já suspenderam a greve e já são poucos os que ainda a mantêm. Por isso, estou optimista – mais três mesitos, dois ou três telefonemas do Passos à Merkel a ver se pode ceder aqui e ali, e a coisa está resolvida.

PS: esta foi a minha 3a crónica no P3 e a que me demorou mais tempo a escrever... Descobri que para falar de certas coisas é preciso ter conhecimentos sobre elas. Caramba, é tão mais fácil dissertar sobre os assuntos que realmente interessam à Humanidade, como as vezes em que adormeço no comboio ou aquelas em que o meu carro me deixa ficar mal...

6 comentários:

  1. Bom artigo.
    É um caso delicado e não o conheço em detalhe. Mas à primeira vista, e atendendo a que o trabalho neste momento é automatizado, parece-me uma classe operária que ganha muito acima do que seria expectável. E que depois se aproveita disso para as chamadas horas extrordinárias.

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  2. excelente, eu ouvi o prós e contras e quando começou eu era das que tinha ouvido que eles ganhavam 5000€ e não só eles mas também todo o pessoal de escritório. Até hoje não encontrei ninguém que quisesse ser estivador, por isso não deve ser assim tão bem pago. Durante o programa... afinal o valor médio "ah e tal, é de 3250€ nunca falámos em 5000€" . ora pelo que me lembro das minhas aulas de matemática a média é uma coisa muito gira porque se eu tiver alguém a ganhar 1000€ basta ter um a ganhar 6000€ (que normalmente é o chefe que está no gabinete a pensar) e a média já dá 3500€ e pimba , estes malditos estivadores ganham 3500€ de ordenado!!!!!! Agora só tenho esperança Tiago que não sejas perseguido pelo governo por andares a dizer verdades, é que até agora é o que tem acontecido a muitos que se metem com eles

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  3. Estou contigo! Eu estou com os Estivadores. Neste país os Estivadores incomodam porque são os únicos que leveram uma greve em frente e que incomodou.Mas não é suposto isso acontecer? Ou seja as pessoas fazem greve, mas sem consequências de maior e daí ninguém criticar desta forma! Para além disso é preciso tentar perceber que nem todos os Estivadores têm um horário simpático, os barcos também atracam durante a noite. E eles são os primeiros a dizer que precisam de mais estivadores, para pararem com o absurdo de horas extra que têm que fazer para manter tudo em funcionamento! Só que esse acesso à profissão deve ser regulado e não através de contratos de trabalho temporário! O que lhe estão a tentar fazer a UE já tentou fazer noutros países, conclusão durante meses os portos do norte da europa estiveram parados, depois tentaram com os gregos..não conseguiram! Por algum motivo os outros sindicatos de estivadores estrangeiros dão um apoio tão activo...é que se conseguem implementar este regime aqui, vão aplica-lo em toda a europa!Eu estou com a Estiva Portuguesa!

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  4. Sou filha e irmã e sobrinha de estivadores .no tempo do meu pai vi
    o meu pai a lamentar-se o tão penoso que era pegar em sacos de 50kg e trabalhar dentro dos vapores frigoríficos e como se ganhava mal,tudo ia para pesca e ninguém para a estiva,com o tempo a profissão foi valorizada o que acho bem,não são eles que ganham bem, os outros é que ganham mal...viva a luta dos estivadores.

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  5. Sal, obrigado!

    POC, abusos existirão sempre em todas classes profissionais. O que não se pode fazer é tomar a parte pelo todo.

    Filha, ainda tive esperança que o Relvas me telefonasse mas nem assim. Estou a ficar desesperado!... ;)

    Maria, e eu estou contigo!

    Anónima, neste país estamos pouco habituados a lutar. Nesse aspecto, os Estivadores são um grande exemplo para todos.

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